Já havia discutido aqui sobre o reflexo das revistinhas em quadrinhos, enquanto produção inserida no mundo, parafraseando Michel de Certeaur, olhando pela janela de um trem, observa-se a paisagem, vestígios e elementos do cotidiano e é inegável a aparente imitação das realidades humanas. Isso não significa dizer que através da janela do trem certeautiana não se encontrem riscos e respingos d’água. A percepção da realidade de uma janela não é o retrato fiel da vida de fato como ela é, entretanto, consideramos importante ver o mundo a luz da produção desse conhecimento humano.
Fiz um preâmbulo para falar de algo considero muito simples, enquanto historiador e ativista dos direitos das pessoas: a discussão nos quadrinhos sobre a questão homoafetiva.
Li uma reportagem em 2012 sobre o primeiro casamento entre Kyle Jinadu e Jean-Paul Beaubier, o super-herói Estrela Polar.
Além disso temos um dos Lanternas Verde, Alan Scott que em sua reformulação dos novos 52, que foi reapresentado como um personagem homossexual.
Então você me pergunta: por que essa onda colorida nas revistinhas em quadrinhos? Lembrem-se que em 2012 o presidente Obama teria declarado ser a favor do casamento entre os iguais. Agora você percebeu que qualquer produção humana não é desvinculada da realidade. Desde sua posição diante das guerras a levantar questões sobre o gênero, as revistinhas buscam discutir com aqueles que a leem inúmeros desafios que perpassam nossa sociedade.
Em minha opinião, discutir a igualdade civil, questão de gênero é um avanço para a sociedade, afinal de conta, os grupos que hoje consomem as revistas em quadrinhos, vamos usar a palavra HQ, são muito heterogêneos. Penso que é válido tantas discussões como essas apresentadas pelos HQ, e é um processo importante para os avanços e conquistas das pessoas que lutam por igualdade. Enquanto observamos o desrespeito, a dificuldade em falar sobre o assunto, herança de uma sociedade pautada pelo preconceito religioso, que restringe o conceito de família heterossexual, cristã com pai mãe e filhos, outros setores de sociedade estão discutindo sobre o assunto a muito tempo.
Tenho uma certa admiração por pessoas que produzem e compartilham o conhecimento sensíveis as demandas e causas dos humanos, afinal de contas, seja homo ou hetero, é preciso pensar no mundo para além do preto e do branco, do pragmatismo e das limitações dos pseudos-responsáveis da moral e dos bons costumes. E por que não aceitar que um cara legal, um super-herói, que muitas vezes vivencia os sentimentos de homens e mulheres comuns terra, possam nos ensinar como viver com mais tolerância e dignidade. Ou é fraqueza demonstrar amor entre as pessoas, entre os iguais, portanto, o herói demonstra sua fraqueza sendo quem é? Ou sem respeito e deixaria de defender o bem. Ser gay, lésbica e super-herói não combinam? Os heróis são ou não são reflexo do espelho do trem da realidade humana, das muitas paisagens da diversidade? Ou não é a essência dos heróis lutar pela virtude e igualdade entre as pessoas?
Rogers Oliveira – Professor de historia
CERTEAU, Michel de. A escrita da História. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.